quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Ensaio 1

Havia o pó.

E aqueles malditos abutres.

Bateu as pontas dos dedos nas botas, tirando um pouco da poeira incrustada nelas. Levantou os olhos, a visão aguçada buscando o horizonte.
Areia e mais areia, naquele deserto sem fim. E o sol prestes a se por.
Reiniciou a caminhada, mal sentindo as feridas nas solas dos pés. Subiu uma duna um pouco mais alta que as demais, buscando novamente a direção a seguir. Logo escureceria, e precisava arranjar um lugar para descansar os ossos.
















Ouviu os coiotes ao longe e com eles, o vento sussurrando a aproximação da noite.
Era um homem velho. Sua pele podia quase ser confundida com sua roupa surrada pelo tempo, mas que mantinha ainda a resistência adquirida com tantas cicatrizes. Carregava uma jaqueta de couro cheia de bolsos. Vestia duas calças, uma jeans e uma de couro por cima. Debaixo da jaqueta, trazia um colete trançado de couro e fibras, onde ficavam penduradas sob as axilas as duas pistolas, prontas pra matar.

As caçadoras. Duas pistolas antigas, prateadas, de canos longos.
Havia matado algumas dezenas com aquelas armas. Tinha aleijado outro tanto com elas.
Porque matar não era divertido.
Diversão era fazer o sujeito se lembrar permanentemente do seu crime.
Diversão era tirar o instrumento que o pecador mais apreciava.
Adorava arrancar os testículos dos infelizes com as balas de prata.
A prata e o pó em que embebia suas balas retardava enormemente a cicatrização dos danos que causava. E isso era bom. Uma memória permanente.
Deliciava-se ao ver as lágrimas escorrendo dos olhos secos dos canalhas, estes sabendo que algo em sua anatomia mudara definitivamente.

Pecadores. Havia cansado de toda aquela merda. Sabia que deveria ser feito algo, e assim decidira.

E pegara estrada.

            Acabou de mascar a palha. Escarrou no pó, olhou em volta com ar cansado. Ao longe, o sol avermelhado se punha rapidamente. A noite não demoraria a chegar, e com ela, todos os seres que com ela acordavam. Era preciso silêncio e meditação, àquela hora.
            Aquele deserto era o maior de todos. A areia e o pó guardavam séculos de caminhadas e sofrimento, de batalhas, sangue e ossos. De excrementos e restos orgânicos de todos os tipos. De máquinas. Um milhão de pessoas haviam passado por ali, muitas delas não chegando ao limite. Era um deserto de morte, cruel com os incautos. Não havia perdão para aqueles que o desafiavam sem o devido temor.

            Acendeu a fogueira e colocou a panela de ferro, carcomida pelo tempo e pelo uso para esquentar o resto de ensopado. Retirou da mochila o pequeno espelho ornamentado e colocou deitado para baixo na areia. Sobre o espelho derramou um pouco de areia branca, e desenhou um símbolo com os dedos. Sempre fazia seu ritual na mesma ordem, para não se esquecer de nada. Um detalhe esquecido, e as sombras desceriam sobre a fogueira.
E sobre sua alma tão disputada. 

5 comentários:

Patty disse...

Quero saber o resto!!! patty

Patty disse...
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Anônimo disse...

TL;DR

Layout limpo, bom, gostei. E remover comentários é feio hein!

F. R. A. disse...

Caro Anônimo,

O comentário foi removido pois aceitei-o duas vezes. Era um comentário repetido. ^^

Anônimo disse...

cheguei a fazer um filminho na cabeça, rsrrs